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Narrador – Por volta de 1339, D. Afonso IV de Portugal e João Manuel, poderoso nobre Castelhano, organizaram o casamento de D. Pedro, príncipe herdeiro, e D. Constança Manuel, ex-mulher de Afonso XI de Castela.
Cena I – O acordo
(entra D. Afonso IV e João Manuel)

João Manuel – Vossa alteza concedo-vos a mão da minha amada e formosa filha Constança.

D. Afonso IV – Ordenai à vossa filha que venha para Portugal imediatamente.
(saem)

Cena II – Casamento
(entra Constança vestida de noiva e aias)

Inês – O casamento foi lindo, senhora minha.

Constança – É verdade, eu estou divina.

Aia 1 – Foi o mais lindo que vi.

Aia 2 – Foi o único que viste
(saem)

Cena III – o descaramento de Pedro

Narrador – D. Pedro recebeu D. Constança como sua mulher, mas apaixonou-se, perdidamente, por uma das aias que a acompanhava.

(D. Pedro regressando de uma caçada)

Pedro – Voltei, senhora! Como tendes passado?

Constança – Bem, senhor. Ainda bem que regressais. E como estais vós senhor?

Pedro – Bem. Como esteve tudo na minha ausência, senhora?
Constança – Bem … agradavelmente bem, senhor.

Pedro – Vou recolher-me aos meus aposentos. Inês, preparai-me o banho.

Inês – Sim, meu senhor.

(Constança mostra-se “furiosa” e triste)
(sai Inês e Pedro)


Narrador – há quem diga que Constança, sabendo do caso, tentou resolvê-lo de uma maneira mais subtil, de modo a que a coroa não fosse mais envergonhada. E o filho que dormitava no ventre de Constança vinha mesmo a calhar. 

Cena V – encontro no rio
(cena romântica entre Pedro e Inês nas margens do rio)

Pedro – senhora minha, como sois bela!

Inês – são os seus olhos, meu príncipe.

Pedro – são os meus olhos e os de toda a corte. Sois o sol que ilumina os meus dias.

Inês – exagerais senhor, exagerais.

Pedro – estou tão feliz por estar aqui convosco, por ti minha bela Inês, romperei meus laços matrimoniais com Constança.

Inês – eu também estou feliz por estar aqui, meu amado, mas peço-vos que não rompeis com a senhora minha, ela é muito bondosa para mim.

Pedro – atenderei ao vosso pedido, minha bondosa Inês.

Inês –  por si vivo e por si morrerei.

Pedro – Por si minha amada, renunciaria à minha própria vida.

Inês – mas peço-vos que não façais isso.
(escondida atrás de uma árvore, Constança, ouvia a conversa dos doía amados)

Constança – (falando para si) isto é a gota de água, a partir de agora eu mesma tratarei do assunto.
(sai Constança)  

Cena VI – O plano de Constança
(entra Constança, rainha D. Beatriz e aias)

Constança – (desesperada) Vossa alteza, minha sogra, ajudai-me por favor.

Aias 1 e 2 – (em coro) Oh senhora minha, que se passa convosco?

D. Beatriz – esta conversa não é convosco, retirai-vos. Constança recompõe-te e dizei-me o que se passa.

Constança – acabei de apanhar meu marido e a minha aia, trocando mimos e carícias, nas margens do rio.

D. Beatriz – já tentei abrir os olhos a meu filho, mas ele está cego de amor por Inês.

Constança – convidarei Inês para ser madrinha do meu filho.

D. Beatriz – minha adorada Constança, percebo o que dizeis e confio em vós. Avançai com o vosso plano o mais depressa que poderes.

Constança – tenha um bom dia alteza.

D. Beatriz – igualmente para vós.



Cena VII – D. Afonso IV pressionado                                              
(Reunião do rei com os seus conselheiros)

D. Afonso IV – Porque marcaram esta reunião?

Diogo – Vossa alteza, a princesa Constança está a dar em doida com o romance entre o príncipe e a aia.

Pêro – Todo o povo comenta a situação.

Álvaro – E se acontecer alguma coisa à criança?

D. Afonso IV – Não, à criança nunca!

Diogo – Tenha calma vossa alteza.

Pêro – Se acontecer alguma coisa ao bebé, exilai Inês.

Diogo – Não, não é caso para isso.

Álvaro – Prometa-nos majestade.

D. Afonso IV – Calai-vos, está prometido meus conselheiros.

(acaba e reunião e o rei permanece na sala)

Cena VIII – O baptizado
(Baptismo de D. Luís)

Narrador – naquele tempo os padrinhos de uma criança passavam a ser como irmãos dos pais da mesma. Um acto de amor entra eles seria considerado um crime. D Constança convidou Inês para ser madrinha do seu filho Luís.

Narrador – Luís morreu passado uma semana do seu baptizado, e então é que se instalou um falatório. A corte comentava pelos corredores que a culpa era de Inês. Com certeza não teria pronunciado com fé as palavras sagradas junto a pia baptismal.  

Narrador – a hostilidade cresceu à volta de Inês, reforçada com este pretexto. Mas a verdade é que há muito despertava inveja. Entre as mulheres por ser linda e entre os homens por não lhes prestar atenção.

Cena IX – O exílio
(rei exila Inês) 

Pêro e Álvaro – vossa alteza, prometido é devido.

Diogo – reconcilie vossa alteza.

D. Afonso IV – a minha decisão está tomada.

Inês – de que falam?
                                          
Diogo – Inês de Castro, por decreto régio estás exilada da corte e da casa real.

Inês – o que dizeis vós?

Diogo – guardas levem-na.
(saem)

 Cena X – Morte de Constança
(nascimento de Fernando)

Narrador – apesar de tudo, D. Pedro não se divorciou de Constança e, um ano depois Constança dá à luz outro rapaz, Fernando. Nessa altura o destino encarregou-se de trazer paz a uma vida de sofrimento para Constança. Por fim, a rainha morre.

Cena XI – Felicidade
(D. Pedro e D. Inês foram viver juntos)

Narrador – em 1345, D. Pedro e Inês foram viver para o norte, longe da corte. Durante alguns anos viveram felizes e despreocupados. Quando já tinham 3 filhos, instalaram-se no paço de Santa Clara perto da Quinta das lágrimas em Coimbra.


 Cena XII – A caçada
(conversa entre Inês e Pedro)

Pedro - Inês, vou passar o dia numa caçada com outros nobres.

Inês – vai com deus, meu amor.

Nobres – apressai-vos vossa alteza que se faz tarde e as lebres e os veados não esperam por nós.

Pedro – Inês, minha amada voltarei ao anoitecer.

Inês - tereis um jantar digno de um rei quando voltares.

Pedro – passe um bom dia minha senhora

Cena XIII – D. Afonso toma a decisão

D. Afonso IV – hoje mesmo mataremos Inês

Diogo – isso trará a fúria do príncipe herdeiro, vossa alteza, peço-vos que reconcilieis e que deixes de perseguir a bondosa e bela Inês. Pensai no sacrifício e sofrimento da princesa Constança.

D. Afonso IV – cale-se já Diogo!

Carrasco – hoje mesmo, a preciosa Inês abandonará este mundo.

Diogo – e D. Pedro?

Carrasco – saiu para uma caçada, não se encontrará nos Paços de S. Clara.

Cena XIV – A morte de Inês
(Inês em casa com os filhos)

Estavas linda Inês, posta em sossego
De teus anos colhendo doce fruito
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a fortuna não deixa durar muito,
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus fermosos olhos nunca enxuito,
Aos montes insinando e às ervilhas
O nome que no peito escrito tinhas

Do teu príncipe ali te respondiam
As lembranças que na alma lhe moravam,
Que sempre ante seus olhos te traziam,
Quando dos teus fermosos se apartavam;
De noite, em doces sonhos que metiam,
De dia, em pensamentos que voavam;
E quanto, enfim, cuidava e quanto via
Eram tudo memórias de alegria.
(canto III, estância 120/121)

Inês – quem sois vós?
(o carrasco os conselheiros afastam-se dois a dois e aparece o rei)

D. Afonso IV – (emociona-se ao ver Inês com os seus netos e retira-se dizendo) dai-lhe o destino que quereis. E sai acompanhado com Diogo)


Traziam-na os horríficos algozes
Ante o Rei, já movido a piedade;
Mas o povo, com falsas e ferozes
Razões, à morte crua o persuade.
Ela, com tristes e piedosas vozes,
Saídas só da mágoa e saudade
Do seu príncipe e filhos, que deixava,
Que mais que a própria morte a magoava.
(canto III, estância 124)

Pêro – estais declarada a morte, linda Inês.

Inês – piedade senhores, piedade… deixai-me viver! Tenho filhos que precisam de mim…   

Carrasco – não! Acompanha-nos senhora?

Inês – concedei-me ao menos, uma última oração.

(carrasco concede-lhe uns minutos e depois degola-a. Ouve-se um grito) 

Narrador – apunhalada sem dó nem piedade, o sangue de Inês escorreu sobre as pedras da fonte e nunca ninguém conseguiu apagar a mancha vermelha que ali ficara para sempre a lembrar o terrível crime. 

Cena XV – A fúria de Pedro
(Pedro encontra Inês jaz junto à fonte)

Pedro – (desesperado) não! Não! Não deixarei de te amar… Vingarei a tua morte…nem que seja a ultima coisa que faça… 

Narrador – D. Pedro, louco de dor, incendeia muitas povoações e castelos que pertenciam a seu pai.
Assi como a bonina, que cortada
Antes do tempo foi, cândida e bela,
Sendo das mãos lacivas maltratada
Da minina que a trouxe na capela,
O cheiro traz perdido e a cor murchada:
Tal está, morta, a pálida donzela,
Secas do rosto as rosas, e perdida
A branca e viva cor, co a doce vida.
(canto III, estância 134)

Cena XVI – Se o arrependimento matasse
(D. Afonso IV e Diogo)

Diogo – vossa alteza, como se sente?

D. Afonso IV – Diogo, se o arrependimento matasse!

Diogo – tenha calma meu rei.

D. Afonso IV – tu Diogo, que sempre me avisaste de tudo e muito mais. Foge agora, que eu arcarei com a fúria de meu filho.

Cena XVII – Guerra entre pai e filho

Narrador – com toda a sua raiva e o seu ódio, Pedro ergueu as suas armas contra o seu pai. E, mais uma vez, pai e filho encontram-se em campos de batalha opostos numa guerra civil.
Após meses de escaramuças, a rainha D. Beatriz interveio, sendo as pazes seladas em Agosto de 1355.

Cena XVIII – Declaração de Pedro
(Após a subida de D. Pedro ao trono este faz um revelação)

Narrador – em Junho de 1360, Pedro fez a famosa declaração de Catanhede, legitimando os filhos, ao afirmar que havia casado secretamente com Inês em 1354…
Capelão – é puramente verdade, eu estava lá, eu sou a sua testemunha.

Bispo – eu próprio os casei em 1354, vossa alteza, o príncipe pediu que eu mantivesse segredo e eu assim o fiz.

Narrador – D. Pedro capturou Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves, condenando-os à morte. Ordenou que lhes fosse arrancado o coração, pelo peito a um e pelas costas a outro.

Cena XIX – Cortejo para Inês
(Cortejo fúnebre de Inês)

Narrador – diz-se que D. Pedro retirou Inês do túmulo, sentou-a no trono e obrigou a corte a beijar-lhe a mão. Mandou construir dois belos túmulos, um para si próprio e outro para Inês.

Pedro – Inês, minha adorada, minha mulher, minha amada…aqui jaz descansada…

Narrador – ordenou que os colocassem no mosteiro de Alcobaça, organizando um cortejo fúnebre entre Coimbra e o destino. Gente do povo, do clero e da nobreza espalhou-se pelo caminho, e todos fizeram vénias à passagem do caixão.
Repousam agora finalmente juntos…frente a frente. Olham-se agora como nunca, em vida, foram livres de se olhar.





Cena XX – Lembrança de Ary dos Santos

Narrador – Ary dos Santos, um dos muitos poetas que contou o amor de Pedro e Inês, deixou-nos este belo soneto, com que terminamos o nosso documentário.


Dos olhos corre a água do Mondego
Os cabelos parecem os choupais
Inês! Inês! Rainha sem sossego
Dum rei que por amor não pode mais.

Amor imenso que também é cego
Amor que torna os homens imortais.
Inês! Inês! Distância a que não chego
Morta tão cedo por viver demais.

Os teus gestos são verdes os teus braços
São gaivotas poisadas no regaço
Dum mar azul-turquesa intemporal.

As andorinhas seguem os teus passos
E tu morrendo com os olhos baços
Inês! Inês! Inês de Portugal.